quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
ROSES OF PICARDY
Dansons la Rose (Yves Montand à l´Olympia de Paris), Version Française de ROSES OF PICARDY by Haydn Wood)
Dire que cet air
Nous semblait vieillot
Aujourd'hui
Il me semble nouveau
Et puis surtout
C'était toi et moi
Ces deux mots
Ne vieillissent pas
... Souviens-toi
ça parlait
De la Picardie
Et des roses
Qu'on trouve là -bas
Tous les deux
Amoureux
Nous avons dansé
Sur les roses
De ce temps-là .
sábado, 22 de novembro de 2008
POEMA (Dom Quixote da seringa)
DOM QUIXOTE DA SERINGA
O homem de pele amarela!
quebrou o jejum bem cedo (pirão de guariba e chá de cidreira)
com a roupa defumada
entranhada de leite de seringa
se jogou no varadouro
e foi cortar
O homem da pele amarela!
Às costas o jamaxim
tão assim grudado
que arrancá-lo antes da noite
é como tirar couro de veado
para patrão comer
é difícil como o saldo
hô diacho!
Vai dentro dele
tabaco para mascar
uma mão de farinha
sua amiga enfadonha
a poronga
uma lasca de jabá
uma faca assassina
que fere a árvore
de onde escorre um sangue branco
O homem da pele amarela!
Levantou bem cedo
comeu pão com café
calçou sua sandália de borracha
caminhous nas ruasdesertas de seringueiras
venceu oito quarteirões
e cinco dúzias de arranhas-céus
e se acabou numa fila do funrural
amarelo e sem sangue
O homem da pele amarela!
(Fernando Sérgio Escócio Drummond Viana de Faria),
Antologia de Poetas Paraenses, 1984,
Coordenação de João do Rego Gadelha,
©SHOGUN ARTE, 1984
O homem de pele amarela!
quebrou o jejum bem cedo (pirão de guariba e chá de cidreira)
com a roupa defumada
entranhada de leite de seringa
se jogou no varadouro
e foi cortar
O homem da pele amarela!
Às costas o jamaxim
tão assim grudado
que arrancá-lo antes da noite
é como tirar couro de veado
para patrão comer
é difícil como o saldo
hô diacho!
Vai dentro dele
tabaco para mascar
uma mão de farinha
sua amiga enfadonha
a poronga
uma lasca de jabá
uma faca assassina
que fere a árvore
de onde escorre um sangue branco
O homem da pele amarela!
Levantou bem cedo
comeu pão com café
calçou sua sandália de borracha
caminhous nas ruasdesertas de seringueiras
venceu oito quarteirões
e cinco dúzias de arranhas-céus
e se acabou numa fila do funrural
amarelo e sem sangue
O homem da pele amarela!
(Fernando Sérgio Escócio Drummond Viana de Faria),
Antologia de Poetas Paraenses, 1984,
Coordenação de João do Rego Gadelha,
©SHOGUN ARTE, 1984
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
EARLS COURT, London- Discover Dogs 2008
domingo, 9 de novembro de 2008
Graças à DEUS e aos ANJOS
Jamais questionei DEUS.
Desde pequena acordava e ia dormir com Deus, Santa Maria, Bebê Jesus, Menino Jesus, Adulto Jesus, Nossa Senhora e o Santo Anjo da Guarda. Sem contar que havia sempre por ali e acolá- a presença do Diabo (o inevitável cão- como chamava quando menina), o espírito das trevas, aquele que faz parte do Sistema, o mestre da tentação... e de quem me arrepiava de mêdo, às vezes somente em ouvir o pronunciar do seu nome.
Cresci entre uma mãe católica e um pai católico.
Papai embora criado na religião católica, antes de se ajoelhar para rezar, obedecia à uma filosofia -e fazia seu possível (e impossível)- para seguir os passos do pai e avô dele que acreditaram e seguiram os princípios da "Ordem da Maçonaria", da qual eram associados.
Fui batizada, fiz primeira comunhão e estudei até o final do ginásio, em Colégio de freiras. Primeiro no Instituto São José em Rio Branco, depois no Colégio Santa Rosa, em Belém, mas nunca me senti uma “cristã” exemplar e a primeira chance que tive, me rebelei e pedi que mamãe me tirasse da tutela (e de debaixo das saias) das Freiras.
Fui estudar no (Sociedade Civil) Colégio Moderno, em Belém.
Já na Faculdade, como todo adolescente rebelde e confuso, eu vivi uma fase muito violenta de questionamentos e de impulsos suicidas. Sim. Porque era romântica e como os românticos eu precisava ir até o fim do ato do romantismo e morrer de amor, no sofrimento, na amargura, na obscuridade e no desespero.
Havia uma bela causa para morrer (ou melhor, me matar) e eu ia me estrangular ou cortar as veias, sangrar até a última gota, motivada pelo meu profundo egocentrismo desesperadamente amoroso e apaixonado.
Nazareno Tourinho (e sua generosidade) me resgatou do suicídio e com seus conselhos comecei a ler os livros de Alan Kardec e tive pela primeira vez um contato com a Doutrina Espírita. Foi uma revelação.
Mas a vida continuou e deixei o Espiritismo.
Continuei viva e curiosa, mas sem praticar nenhuma religião.
Na minha vida de adulta continuei lendo e num outro momento que me senti desesperada, aqui em Londres, busquei conforto, novamente na Doutrina Espírita.
Durante um ano certinho eu fui aos encontros e li, estudei e pratiquei.
Hoje eu me recuso fazer parte de “clubes”, associações, entidades.
Eu preciso viver a vida sem “laços” e sem carteirinhas de sócio.
Não tenho nenhum tipo de fanatismo, não sou adepta à seitas nem crenças nem rituais, nem religião. Minhas duas filhas não são batizadas, não torço para time de futebol, não tenho grupo de rock, não tenho ídolos, não assino nenhum jornal nem revista, não freqüento os Alcoólatras Anônimos nem tenho preferência por escola de samba no carnaval, não tenho partido político, não faço passeata nem desfilo com bandeiras, não uso crachás, não uso griffes, não sou vegetariana, não tenho nenhum tipo de convicção, não sigo nenhuma filosofia Budista ou oriental nem ocidental, apenas pratico meditação porque sou muito nervosa, energética e agitada.
Meditar 15 minutos por dia me ajuda a enfrentar o batente.
E continuo com o desejo de me "sentir livre" para acreditar e cultuar o que eu acho o certo, para mim.
Sou tolerante com a religião e crença dos amigos, parentes e desconhecidos.
Não questiono a fé e obediência de ninguém (ao contrário, tenho respeito e admiração pelos que acreditam, sobretudo os disciplinados) e acho que cada um tem o direito pleno de acreditar e rezar no livro que bem entender e desejar.
Se minhas filhas quiserem seguir uma religião eu não vou impedí-las.
Eu decidi cultuar a HONESTIDADE do espírito e levar uma vida fazendo e praticando o BEM. Procuro ser (à medida do possível) Politicamente Correta, fico do lado dos pobres e indefesos se tiver que escolher um lado e faço reciclagem do meu lixo, como comida orgânica, se não puder como qualquer tipo de comida e procuro economisar o máximo que posso na minha casa (energia, água, gás) etc... e decidi que essa é minha religião e minha filosofia.
Ontem eu sofri um acidente.
Maya estava comigo no carro.
Eu havia acabado de sair de um estacionamento e pegava uma rua muito estreita, como são algumas ruas aqui de Londres, algumas delas, muitas vezes- duas mãos.
Mas essa rua era mão única, muito estreita, ambos os lados empilhados de carros estacionados e me lancei.
No momento em que eu perguntava “Maya, e o cinto, já colocou?”
Antes que ela pudesse responder eu freiei bruscamente, porque um homem apareceu bem na frente do meu carro, não sei de onde saiu.
Literalmente ele ocupou o MEIO da rua, com a porta do carro dele aberta.
Eu tive tempo de dizer “Meu Deus!” e a Maya voou para frente, batendo com a cabeça no vidro do painel do carro.
O vidro rachou de cima em baixo.
Examinei a cabeça da Maya, saber se ela não tinha nenhuma ferida ou uma lesão.
O homem que se aventurou na frente do carro apenas olhou para mim e continuou o que estava fazendo.
Ele estava colocando um guarda-roupa no maleiro do carro dele e não se importou de pedir “emprestado” a rua – onde eu ia passando dirigindo o carro.
Não havia o que entender.
Era ELE ou EU/meu carro, naquele espaço.
Automaticamente eu abaixei o vidro da minha janela e gritei por “Socorro”.
Pedi que o homem viesse me ajudar, ver de perto o que havia acontecido.
Duas outras pessoas apareceram e percebi que estavam juntos.
Eu insisti que viesse (POR FAVOR) ver o que havia causado, pedi que me AJUDASSE.
Me sentia tal chumbo, tão pesada e meu coração batia acelerado.
Tive mêdo.
Pedi. "Senhor por favor, me ajude".
O homem disse em voz alta, para todos ouvirem, “Não é problema meu, não me culpe por seus erro.”, e me ignorou.
Estava acompanhado inclusive de uma senhora idosa, os três continuaram empurrando o armário para dentro do carro deles, como se nada tivesse acontecido.
Percebi que falavam inglês com sotaque estrangeiro.
Muito nervosa e confusa, sai do carro e peguei meu celular.
Meu primeiro intuito foi chamar 999, o número da Polícia que também é ligado ao serviço de ambulância.
Nesse momento, não esquecendo que estava no MEIO de uma rua, estacionada,
um carro se aproximou e parou atrás do meu.
Tive tempo de ler, escrito: “Polícia” no capô do automóvel e nas portas.
Disse para mim mesma, “Só pode ser um Milagre de Deus.”
Andei em direção do carro, dele desceram dois Policiais Ingleses.
Um deles ficou comigo o outro seguiu para ver o que havia acontecido, pois nesse momento os dois homens e a mulher pareciam inquietos, na calçada.
Não ouvia o que diziam mas o Policial gritou com eles com autoridade e ai subitamente eles fizeram silêncio.
Tive tempo de explicar o que EU HAVIA VIVIDO naqueles últimos minutos, para o Policial que havia ficado comigo. Ele pediu que eu me acalmasse e me acompanhou para ver a Maya, que, coitadinha, estava COLADA, sentada no banco do meu carro. Olhos arregalados, em silêncio.
Peguei-a nos braços e a consolei.
Só pude dizer “Graças à Deus, você está viva”.
Bem, ficamos todos ali, na rua, fazendo o constato e perícia.
Cada um dava sua versão dos fatos.
Tinha razão, o Homem e seus amigos eram Filipinos.
De repente, tomei um susto, pois uma ambulância chegou imediatamente.
O Policial havia pedido que viessem examinar a cabeça da Maya.
Ele explicou que fez isso por prudência.
Quanto à mim, tive que assoprar num “balão”.
Fazia parte da investigação para ver se estava dirigindo “alcoolizada”.
O teste deu negativo, obviamente.
Mas a prioridade era a Maya.
Ela estava muito calada e depois começou a chorar, soluçando.
Os dois Enfermeiros que vieram na ambulância acharam mais seguro levá-la para ser examinada por um Médico no Hospital e se necessário fazer exames.
Chegando ao Pronto Socorro, para nossa surpresa, o Martin, meu marido, estava lá.
Nesse meio-tempo a Polícia havia telefonado para nossa casa- para investigar se eu havia dado o endereço e telefone corretos e o Martin quem atendera ao chamado.
Explicaram para ele o que havia acontecido, ele já havia então ido ao local do acidente, pegado o nosso veículo e rumado para o Hospital. Chegou antes da ambulância.
Maya foi examinada. Estava bem, não havia sinais de cortes nem sangue.
Tivemos que esperar durante quatro horas num leito do PRONTO SOCORRO, tempo que ela ficou em observação, caso de haver sangramentos ou alguma lesão interna.
Fomos liberados, deixamos o hospital, chegamos em casa 9 horas da noite.
Ajoelhei e REZEI.
Agradeci à Deus por minha filha estar viva e sã.
Agradeci à Deus por eu estar viva.
Agradeci à Deus pelo Homem (Filipino) estar vivo.
Voltando ao PRONTO SOCORRO.
Estávamos sentados, quando entraram na sala os dois Policiais Ingleses que vieram conversar com Martin e comigo. Era praxe.
Eles precisavam que assinássemos um papel, questão de protocolo e pedia que eu me apressentasse na próxima segunda feira na Estação de Polícia do meu bairro com os documentos de seguro do carro.
Eles explicaram que o Senhor (do acidente) era Filipino, morava ali naquele local com a família e tinha a intenção de transportar um armário no bagageiro de um carro (menor que o armário).
Esse Senhor Filipino disse ao Policiais que EU estava dirigindo “Feito uma louca” e que eu dizia coisas sem nexos, como se eu tivesse “Drogada”.
Disse que o acidente tinha sido MINHA culpa.
Claro que eu fiquei furiosa com essa versão, mas o Policial -que desde o início me atendeu-, me pediu que eu ficasse tranqüila.
Ele explicou que,
SE eu tivesse dirigindo “feito uma louca” - em alta velocidade, como o Filipino dissera,
a Maya teria VARADO o painel da frente do carro e
o Filipino não estaria ali, inteiro, contando lorotas (eu teria arrastado ele, a porta do carro dele e o pedaço do armário juntos)!
No entanto EU estava fora-da-lei pois saíra do estacionamento sem me certificar que a Maya havia colocado o cinto de segurança.
O Policial nos perguntou se nós tínhamos a intenção de PROCESSAR o Senhor Filipino por NEGLIGÊNCIA (falta de dar atenção e ajuda à pessoas em perigo) e nos explicou que eles já o haviam multado, por ‘tentativa de transportar objetos num carro sem qualificação para aquele tipo de carga’- e nos explicou – que se fossemos em “Juízo” iríamos ganhar a causa.
Martin e eu olhamos um para o outro e (cúmplices) dissemos a mesma frase,
quase ao mesmo tempo: “Deixe pra lá. O importante é que estamos todos com vida”.
E eu completei... “Graças à Deus”.
DOIS ANJOS enviados por DEUS.
Maya e os Dois Policiais Ingleses que nos socorreram.
A foto tirei com meu celular- a qualidade não é genial, mas o momento ficou registrado.
Amém.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
Oona is leaving home..
Monday morning, 20th October....
...She is leaving home.
“She (we gave her most of our lives)
is leaving (sacrificed most of our lives)
home (we gave her everything money could buy)
She's leaving home after living alone for
so many years (bye bye)”
John Lennon e Paul McCartney poderiam ter escrito essa música HOJE e eu iria achar que tinham lido meus pensamentos, meus sentimentos e decidiram compor SHE IS LEAVING HOME.
McCartney disse que a inspiração para esse titulo do álbum “Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band” foi uma nota num jornal no qual noticiava o desaparecimento de uma garota, como acontecia nessa época, período em que muitos jovens saiam de casa deixando apenas um bilhetinho.
Minha garota não foi embora numa quarta feira, nem saiu escondida, deixando apenas um bilhete.
Oona saiu de casa, ontem, segunda feira.
Acompanhei-a de carro.
Não havia neblina em Londres mas poderia ter sido o caso, para acentuar ainda mais o meu estado de melancolia e dar uma atmosfera dramática ao evento.
Chovia.
Chuva fina e eu tentava não chorar.
Não chorei.
Acompanhei-a à Saint Pancras, a nova estação da EUROSTAR.
Ela viajou para Paris, fazendo o mesmo trajeto (no senso inverso) que fizemos juntas em maio de 1994, só que na época viemos de avião pois ainda não havia o trem que atravessava o Canal da Mancha.
Dessa vez Oona viajou sozinha e eu fiquei.
Mas não fiquei sozinha.
Tenho a Maya e Martin e Dinah, a gata.
Minha família.
Ontem Maya acordou muito cêdo, mais do que de hábito e pediu para ficar em casa , dizendo que sofria de dor na garganta. Antecipando seu estado de saúde, me advertiu que ia “pegar” febre e sofrer muito se estivesse na escola, “sozinha”.
Achei engraçado.
Percebi, com a experiencia, que quando a criança diz “ficar sozinha”, ou simplesmente “só",
na maioria das vezes não quer dizer “desacompanhada”, mas simplesmente “sem o pai” ou “sem a mãe”, que é sinônimo para elas, nessas circunstâncias, de “abandono”.
Como sou longe de ser uma mãe negligente, imaginei a Maya com febre, dor de garganta, “sozinha”, na escola.
Mas ai pensei, “que absurdo”!.
Claro que ela não iria ficar “sozinha”, considerando os professores, inspetores, diretor e centenas de alunos do estabelecimento.
Maya é uma criança e como todas as outras, tem uma fértil imaginação.
Mas lembrei-me a tempo que muitas mães raciocinam igualzinho à Maya, nesse caso específico da “solidão”.
Muitas mães possuem, o que eu considero, uma constante “dependência sentimental”, pelos filhos. O que os franceses chamam o síndrome da “Mãe Judia”. Aquela (super-mãe) que super-protege a criança e que não se dá conta que a "criança" cresceu e que está de barba branca.
A super-mãe é aquela que, quando não vê o filho ou a filha por perto, ali, "agarrado" na sua beira de saia acha que eles irão se encontrar “sozinhos” no mundo, expostos aos “perigos” e por causa disso, elas vivem (eternalmente) preocupadas.
Essas mães precisam “fiscalizar”
o que seus filhos fazem,
com quem eles fazem e
aonde o fazem.
...E elas só serão mães felizes e "completas" se estiverem por perto,
CONTROLANDO a vida dos pimpolhos,
porque elas acham que seus filhos/filhas (longe delas) estarão “sozinhos”.
Eram cinco da manhã eu acabara de abrir os olhos e meus pensamentos voavam, se alinhando numa seqüência de flashes, indo em todas em direções.
Pensei num cafezinho ou talvez um chá, que ia me ajudar a despertar.
Ainda era escuro e ouvia a chuva batendo na vidraça da janela e o som dos pneus dos carros deslizando no asfalto molhado.
Maya me cutucou e me fez lembrar que estava com dor de garganta.
“Mãe não estou me sentindo em forma, melhor faltar a aula hoje”, disse.
Pensei, das duas uma: ou está mesmo doente ou esta fazendo dengo e me enrolando.
Me veio uma idéia que ia me ajudar a tirar a “prova”.
Disse em voz alta: “Me espere, vou buscar o xarope”.
Maya não toma qualquer tipo de remédios, até os xaropes doces com gosto de fruta, ela detesta.
Interessante é que Maya jamais perde uma chance de entrar num hospital ou num pronto socorro. Adora tudo relacionado com médicos, enfermeiros, ambulância, saúde, doença e por ai vai. Cheguei a me preocupar seriamente com ela pois sempre foi assim, desde nenem, a menina sempre teve uma certa obsessão por “medicina”.
Sua avó, Joyce, lhe perguntou que ela gostaria de ganhar como presente de aniversário. Maya ia fazer 1 ano. Ela respondeu à avó, sem hesitar: “Um estetoscópio”!
Joyce quase teve um “troço” pois jamais imaginou que uma criaturinha daquele tamanho pudesse pronunciar tal palavra e ficou sabendo que sua netinha sabia exatamente para que servia o utensílio, pois ela brincava, há meses (!) com um, de plástico, no "Jardin de Infância". Maya é estranha com essas coisas de “doença”. As vezes, ela me pede para ir visitar o “Westminster Chelsea Hospital”, do mesmo jeito que Oona me pede para ir com ela à “Tate Gallery” ou ao “British Museum”, ver uma exposição.
Inventou outra doença para eu ter que levá-la ao Pronto Socorro-, fui pensando, enquanto eu andava em direção da cozinha, atrás de um café e de um xarope.
E se Maya tivesse mesmo com um resfriado?
Seria melhor ficar com ela em casa, agasalhada, mas me lembrei que de qualquer maneira iria precisar sair e expor-la ao vento e ao frio do inverno Europeu, visto que há semanas me preparava para acompanhar a Oona até o Eurostar.
E era um dia especial para todos nós.
Nada ia sabotar essa viagem. Nada!
Oona ia viajar para começar uma nova vida, numa outra casa, num outro país.
Eu havia apoiado sua decisão.
Por amor.
Ouvia o barulho do chuveiro, na sala de banho.
Oona tomava uma ducha e ia levar 1 hora mais ou menos para fazer sua toilette e se maquilar.
Fazia isso todos os dias.
Imaginei que talvez fosse demorar um pouquinho mais porque ela havia comprado uma roupa especial, por causa do frio, então ia se maquilar, se labusar de cremes e perfumes, para sua viagem.
Há pouco menos de uma semana lhe dei de presente uma capa de couro que possuo há mais de duas décadas. Trata-se de um "Perfecto".
Percebi que ela gostava do blusão e lhe dei de presente para estrear, na sua nova vida.
Bati na porta e perguntei: "Tudo bem"?
Ela me respondeu: "Tudo bem, mãe.", em portugues.
Que besteira- pensei, eu disse "tudo bem" em portugues, ela me respondeu em portugues.
Mas essa é a brincadeira entre a Oona e eu.
A gente se fala em três línguas (portugues, ingles e frances).
A familia e amigos já sabem, muitos deles já desistiram de tentar nos "acompanhar" numa conversa.
Esse é um códico entre nós duas.
Perguntei em seguida: "Tea or coffee?" Ela me respondeu: "Céreal!!!"
Ai eu me dei conta que eu estava (colada), atrás da porta do banheiro.
Havia parado lá, perguntando pra Oona se queria chá ou café.
Que absurdo.
Em dias normais eu não pergunto se ela quer chá ou café porque eu sei que ela não bebe nem chá nem café!
Ai eu me lembrei da Maya.
Maya pegou o hábito de dormir comigo quando o Martin está viajando.
Para que EU não me sinta tão “sozinha”, justifica ela.
Quando entrei no quarto ela estava sentada, na cama, olhos arregalados, fixou o vidro de “Calpol” e me disse:
“Mãe, se eu tomar o xarope eu posso ir com a Senhora deixar a Oona no trem”?
Ai que eu saquei o que se passava, exatamente, por detrás de uma simples “dor de garganta” e no seu “sacrifício”em encarar tomar o remédio.
Maya estava- tanto quanto eu - ansiosa com a viagem da Oona.
Pedi que abrisse a boca, examinei sua garganta, não estava vermelha, ela não tinha febre ou tosse, mas tive que mentir (para não entrar em contradição comigo mesma e não dar mal “exemplo”) e disse que sua garganta estava “vermelha” mas que
não precisava tomar o remédio e que eu iria ligar para sua escola, mais tarde, dizendo que estava doente com resfriado.
Ela pulou da cama com alegria, dizendo “Cool”!
Ai eu a ameacei, que se “piorasse” ia levá-la ao Pronto Socorro.
Ela gritou outra vez “Yes”!
Havia esquecido que na verdade não era ameaça nenhuma para ela e sim uma alegria ir visitar o Pronto Socorro.
Tomamos café. Eu tomei café.
Maya tomou chocolate com um 'pain-au-chocolat' e Oona comeu uma cuia cheia de cereais, com leite.
Não houve conversa.
Todas três, ainda sonolentas.
As 10 horas estávamos na rua, pronto para encarar o engarrafamento de Londres.
Peguei a Marylebone Road, a chuva caia bem fininha...
Maya e Oona brincavam a brincadeira do “enforcado/a”
... aquela que uma pessoa imagina uma palavra e a outra tem que adivinhar qual palavra é, acertando letra por letra ou errando sob pena (de traço por traço, no desenho) de ser enforcada.
Oona recebeu os resultados dos exames (que correspondem ao Vestibular do Brasil) em julho, mas decidiu que não ia cursar Faculdade, irá somente ano que vem.
Ainda tem dúvida do curso que quer fazer mas sabe que é no setor das “Artes”.
Talvez "História da Arte", talvez "Belas Artes".
Algo a ver com “Arte”.
Aqui na Inglaterra, alguns jovens na mesma situação que Oona, depois do VESTIBULAR decidem passar um ano sem estudar (GAP YEAR).
Ai eles viajam, passeiam ou decidem trabalhar.
Entram na Universidade um ano depois do Vestibular.
Geralmente eles encontram, durante esse período, uma verdadeira VOCAÇÃO .
Findam indo para a Universidade mais seguros com a escolha do curso, estudando até o final, saindo diplomados.
Acho muito interessante esse sistema, afinal creio que existe muita pressão em cima de um jovem quando ele tem que escolher um CURSO UNIVERSITÁRIO, assim imediatamente logo após o colégio, sem ter nenhuma experiencia na vida, numa profissão, às vezes sem nenhum contato com a realidade (da carreira que escolhe), quando sabemos da vulnerabilidade deles, sobretudo influenciado pelos desejos e "frustrações" dos pais.
Por isso CONCORDEI que Oona tivesse seu GAP YEAR.
Tempo que vai decidir que profissão vai abarcar, pelo menos ESTUDAR.
Já é - para mim- uma grande coisa.
Me lembro que na mesma idade da Oona, fiz vestibular para "Direito" na Universidade Federal do Pará. Passei de primeira, faculdade com muita concorrência mas eu achava "normal" ter passado. Não sentia "emoções", não sabia se queria ser "advogada".
No segundo ano de faculdade mudei para o curso de "História" e depois para "História da Arte", quando fui morar em Paris.
Findei me formando em "Cinema", quase duas décadas depois, fiz Pós-Graduação em "Produção de Filme e Vídeo" , aqui em Londres e até hoje acho que na verdade devia ter estudado "Letras" ou "Filosofia", quem sabe "Jornalismo"? !
Vai ver...
Desde o começo desse ano, Oona sabia que não ia cursar Faculdade.
Eu me irritei, esculhambei, puxei os cabelos mas ela manteve na sua posição.
Deixei que ela escolhesse "sozinha".
Primeiro trabalhou por cinco meses (meio expediente) como vendedora numa loja de roupas íntimas, na “Kensington High Street”, a umas 6 quadras daqui de casa.
Achei interessante ver que se apegou ao trabalho com responsabilidade. Ela acordava todos os dias muito cedo e ia alternadamente para o colégio ou para o trabalho.
Jamais tive que "sacudi-la", para fora da cama.
Em pleno verão decidiu viajar de férias conosco (Martin, Maya e eu) e no período em que deveria começar a estudar, (SETEMBRO), ela me anunciou que havia decidido viajar para morar com o pai dela, em Paris.
Essa decisão então, foi tomada há 1 mês, exatamente.
De lá pra cá evitamos conversar sobre essa viagem, sobre sua decisão.
Não que eu tivesse algo contra, mas porque o tempo passou muito rápido e essa viagem para mim, cêdo ou tarde eu SABIA que ia acontecer.
Estava escrito assim.
Sei disso porque também fui JOVEM e isso aconteceu comigo.
Um dia deixei a casa de meus pais e fui embora do meu país.
Mamãe me conta que tinha 7 anos quando lhe anunciei que assim que eu completasse a idade adulta, ia viajar para bem longe. Pedi-lhe que não se "apegasse" à mim.
Conta ela que eu repeti essa mesma conversa algumas vezes, expressando assim pontualmente, esse desejo. Ela acreditou em mim. Jamais duvidou da minha capacidade.
Quanto à mim esqueci desse "pequeno" detalhe, dessas conversas com mamãe.
Uma coisa certa é que eu parti. Para Paris.
Não via a Oona direito, há quase uma semana. Ela teve festas e saídas em clubes, pubs, quase todas as noites (muitas DESPEDIDAS), festinhas organizadas pelos seus amigos e (ex) namorado e durante o dia ela estava ou dormindo ou cansada. Como eu vivo uma rotina, minhas ocupações, trabalho e responsabilidades da casa, entre outras com a Maya eu não percebi que o última semana havia passado tão rapidamente e que na Segunda Feira, dia 20 de Outubro, Oona ia viajar.
Oona foi.
Deixou nossa casa, na Inglaterra, para viver uma nova vida, na França.
Martin apoiou a sua decisão.
Ele tem certeza que ela vai ser feliz na sua PÁTRIA.
Ele considera Oona, uma verdadeira francesa.
Nos seus gostos, na sua maneira de pensar.
Eu não sei como a vejo.
Depende do momento.
Inglesa, francesa, brasileira, não importa.
Oona escolherá o que quiser SER.
Que país vai querer viver.
Que nacionalidade vai adotar.
O pai da Oona é frances.
Oona nasceu em Paris.
Aliás, Oona nasceu no "American Hospital", em Neuilly-Sur-Seine, bairro perto de Paris.
Eu também achei que ela devia ir de volta para a França e lhe dei minha "Benção".
Acho que ela deve seguir seu instinto e seu desejo de se aproximar do pai, com quem ela não mora desde nossa separação, quando ela tinha 4 anos.
Seu pai está muito feliz que ela vá morar com ele.
Está nas "nuvens", de tanta felicidade e ele comprou um cachorrinho para ela, de presente, que chamou de "Doc".
Desejo que Oona seja feliz.
Por amor.
Com amor.
Meu amor.
Meu amor de mãe.
Ontem mesmo, depois de deixá-la na estação, fui com Maya, fazer umas compras.
A chuva não parava, entramos numa loja de roupa, a GAP.
Meu primeiro reflexo foi ver um agasalho de lã, pensei que ia ficar bem na Oona, por causa do frio. "Oona vai gostar", disse alto para Maya ouvir, ao mesmo tempo que olhava o número do manequim. De repente me deu um aperto no peito.
Lembrei-me que Oona não mora mais aqui.
Lágrimas caíram dos meus olhos e senti um aperto na garganta.
Maya percebeu.
Ela me disse, “Mamãe não chore, não fique triste que a Oona vai voltar. E eu estou aqui, você não está sozinha.”
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